Instituto Pensar - Tecnologia 5G pode aumentar o desemprego no campo

Tecnologia 5G pode aumentar o desemprego no campo

por: Ana Paula Siqueira


Foto: Lilian Alves

O que parece um futuro promissor na produção de alimentos pode se tornar o fim de milhões de empregos. A implantação da primeira antena 5G em uma fazenda modelo em Mato Grosso promete ampliar a produção no campo. Porém, a mão-de-obra que atua no setor está sendo deixada de lado pela modernização. Falta de profissionalização aliada aos baixos investimentos em outros modelos agrícolas fizeram com que 1,8 milhão de vagas deixassem de existir entre 2012 e 2019.

Pequenos produtores e agricultores familiares, responsáveis por 70% dos alimentos que chegam às mesas, seguem à margem dessa modernização. As tecnologias digitais são caras e inacessíveis para a maior parte deles. O que torna ainda mais difícil competir num mercado tão desigual.

De acordo com o Censo Agropecuário 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a mecanização do campo alterou o perfil do trabalhador e culminou com a redução dos postos de trabalho. Enquanto o número de estabelecimentos com tratores aumentou 50% quando comparado com o levantamento anterior, de 2006, foram 1,5 milhão de empregos a menos.

Falta de qualificação continua um gargalo

O gerente técnico do Censo Agropecuário, Antonio Carlos Florido, explica que a falta de qualificação aliada a modernização do campo é responsável pelo fim de muitos empregos. "Quem não se qualifica tem que fazer trabalho braçal e o trabalho braçal está terminando. Se você tem uma máquina que faz o serviço de 100 pessoas, para aquela pessoa que sabe operar essa máquina tem emprego?, avalia.

Outro dado é a necessidade dos mais jovens continuarem a ir em busca de uma vida melhor longe do campo. O percentual de produtores com mais de 65 anos aumentou de 18% para 23% nos últimos 11 anos, enquanto o de produtores entre 25 e 35 anos caiu de 14% para 10%.

"O produtor está envelhecendo, a média de pessoas está diminuindo. A pessoa entra na fase de ganhar dinheiro para se manter e acaba buscando outra atividade.?
Antonio Carlos Florido

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Avanços do 5G são desiguais

O avanço dessas tecnologias já é uma realidade em todas as áreas. No Brasil, o governo federal privilegiou o acesso da quinta geração de internet para o agronegócio. Os pequenos produtores continuam perdendo espaço. Processo que está só no início, conforme a Joyce Souza, jornalista e cientista social, doutoranda em Ciências Humanas e Sociais na Universidade Federal do ABC.

Ela observa que apesar de 84% dos produtores utilizarem ao menos uma tecnologia digital, a maior parte se refere a aplicativos ou programas mais simples, como WhatsApp e Facebook. Distante ainda de tecnologias mais complexas como Inteligência Artificial (IA).

Os dados são da pesquisa Agricultura Digital no Brasil, realizada em parceria pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O estudo revela ainda que o valor do investimento nessas soluções assusta 67% dos agricultores. E que a ausência de infraestrutura de conectividade é o maior entrave da "agricultura digital? para 61% dos entrevistados.

"É fundamental observar que este é um cenário díspar. As inovações e ferramentas tecnológicas que prometem tornar os sistemas agrícolas mais eficientes, sustentáveis e economicamente mais rentáveis, como a agricultura de precisão, não são projetados para que os pequenos produtores tenham acesso.?
Joyce Souza

Joyce observa que a lógica do desenvolvimento dessas tecnologias é direcionada para os grandes. Quanto maior a propriedade, maior é o volume de dados que pode ser coletado e utilizado no desenvolvimento tecnológico. "Em outras palavras, o investimento para a aquisição e implementação de tecnologias digitais na produção tende a ser altíssimo e inviável ao pequeno produtor?, resume.

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Governo federal prioriza os grandes

Na última semana, o governo federal instalou a primeira antena 5G no campo, na fazenda modelo do Instituto Matogrossense de Algodão (IMAnt), em Rondonópolis (MT). "A tecnologia 5G ajuda na parte de monitoramento de comunicação no campo. Então, tem colheitadeiras-robôs, por exemplo, que podem ser controladas remotamente, e tendo 5G pode usar para fazer esse tipo de controle remoto?, afirma Luiz Claudio Schara Magalhães, doutor em computação e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF) em entrevista à agência Sputnik Brasil.

O leilão do 5G, no entanto, vai atrasar pelo menos um mês, de acordo com o Ministério das Comunicações. A expectativa era que o certame fosse realizado em junho deste ano. O atraso teria sido por questionamentos feitos pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que analisam as regras do edital definidas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel).

Os técnicos questionam, principalmente, a legalidade da obrigação das empresas que arrematarem as licenças da nova tecnologia sobre a construção de uma rede privativa para a administração pública federal e a conexão da região Norte à internet, por meio do Programa Amazônia Integrada e Sustentável.

5G pode chegar ao Norte pelos rios

Seriam mais de R$ 1,5 bilhão investidos na instalação de fibras ópticas no leito dos rios da Amazônia para levar internet a cerca de 10 milhões de habitantes da região Norte. As empresas argumentam que seria mais vantajoso levar a internet por meio de outras tecnologias, como o rádio. Afirmam que além das dificuldades de instalação, seria necessário concretar as fibras ópticas no fundo dos rios para evitar danos e garantir o seu funcionamento.

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Cálculos preliminares da Anatel indicam que os blocos das quatro faixas de frequências destinadas à telefonia 5G custarão, no máximo, R$ 35 bilhões. As frequências são como avenidas no ar por onde as empresas fazem trafegar os dados. Nessa conta, não estão incluídas as obrigações da internet por fibra óptica na região Norte nem a construção de uma rede privativa para o governo federal.

Educação no fim da fila das prioridades

Enquanto isso, o presidente da República vetou totalmente o projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional que pretendia garantir acesso à internet para alunos e professores da rede pública. O Congresso Nacional ainda pode derrubar o veto, mas não há previsão de data. Cerca de 30% das 140 mil escolas públicas do país não têm nenhum acesso à internet.

A medida determinava repasse de R$ 3,5 bilhões da União para estados, Distrito Federal e municípios. Os recursos seriam sairiam do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust).

Os recursos garantiriam 20 gigabytes de acesso à internet por mês para todos os professores do ensino fundamental e médio das redes estaduais e municipais. Os alunos da rede pública do ensino fundamental e médio de famílias inseridas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico) e os matriculados nas escolas das comunidades indígenas e quilombolas também seriam beneficiados.

Falta internet nas escolas no leilão 5G

Em outra frente, parlamentares da Comissão de Educação e do Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados que acompanha a implantação do 5G no país cobram a inclusão no edital da obrigatoriedade de as empresas garantirem a conexão para as escolas da rede pública. A medida poderia atender 14 mil escolas.

Porém, embora o leilão para explorar o 5G no país tenha sido adiado para julho, a preocupação do governo é não atrasar o cronograma quando se trata de investir em educação.

O presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Leonardo Euler de Morais, afirmou, em audiência com os parlamentares na última semana, que alterações no edital podem atrasar ainda mais a licitação. De acordo com ele, todo o processo para a publicação do certame teria de ser refeito.

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Autorreforma defende acesso às tecnologias

Autorreforma do PSB defende a importância do uso das tecnologias para melhorar a produção dos pequenos agricultores, com a inovação e a economia criativa como um dos eixos do desenvolvimento sustentável do país.

"Nesse contexto é necessário, com urgência, aumentar a produtividade e a densidade tecnológica do conjunto da atividade agropastoril, de modo a preservar as áreas de floresta, a biodiversidade, o modo de vida de populações tradicionais e povos indígenas.?
Autorreforma do PSB

Para garantir acesso aos recursos, uma das medidas defendidas é o fortalecimento do Programa Nacional de Agricultura Familiar (Pronaf) para promover a ampliação ou modernização da estrutura produtiva nos estabelecimentos rurais.

Os pequenos produtores têm acesso a apenas 14% de todo o financiamento disponível para a agricultura e se concentram em apenas 23% das terras agriculturáveis no país. Enquanto a agricultura familiar no Brasil é a principal produtora dos alimentos que vão para a mesa dos brasileiros ? 70% do que é consumido.

"Diferente das monoculturas desenvolvidas pelo agronegócio, esse tipo de manejo do solo produz alimentos variados, e é realizado quase sempre com respeito ao solo e ao ecossistema, e é feito por brasileiras e brasileiros que tem a terra como a principal fonte de sustento?.

Agricultura familiar é essencial para a economia

A agricultura familiar diferencia-se dos demais tipos de agricultura pois a gestão da propriedade é compartilhada pela família e os alimentos produzidos constituem a principal fonte de renda para essas pessoas. No Brasil, a atividade envolve aproximadamente 4,4 milhões de famílias e é responsável por gerar renda para 70% dos brasileiros no campo.

Isso não quer dizer que o PSB seja contra o agronegócio. Na avaliação do partido, o setor representa importante fator de fortalecimento da economia brasileira e das exportações.

"A Organização das Nações Unidas para Alimentação (FAO) aponta que a agricultura mundial terá de ampliar em 80% a produção de alimentos, até 2050, para atender às necessidades de uma população projetada de 9,7 bilhões de pessoas. Nesse cálculo, o Brasil deverá responder por metade desse montante.?
Autorreforma do PSB

Com informações da Folha de S. Paulo, Olhar Digital, Valor EconômicoOutras Palavras



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